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A Santa Rita de Santa Cruz
29.07.2010
Era uma jovem viúva, na casa dos trinta anos, bonita, olhar sereno, calma e decidida. O marido havia sido assassinado por desafetos, e os dois filhos do casal pensaram em vingar a morte do pai, mas morreram pouco depois, vítimas de grave doença – talvez a peste – que afetou a ambos, ao mesmo tempo. Falava-se de um pedido a Deus feito pela mãe dos garotos para evitar dita vingança, mesmo se isso viesse a custar a morte precoce dos meninos. Porém, muitos não viam verdade nessa história, pois jamais uma mãe faria um pedido desses. Aquela mulher, que vivia em uma região rural no centro da Itália, em um período tardio da Idade Média, entre os séculos XIV e XV, diante de tamanha dor, reviveu sonhos da juventude no intuito de ingressar no mundo da clausura, a fim de revigorar a fé e de aumentar a prática da caridade.
Assim, Rita – esse era o seu nome – dirigiu-se ao convento agostiniano da região, na ânsia de receber boa acolhida nas suas pretensões. Mas a direção negou-se a aceitá-la, porquanto uma mulher que fora noiva, casada, mãe e, agora, era viúva, não podia conviver na paz quase celestial daquele centro de reclusão e de orações. Os pecados do mundo poderiam ali chegar, trazidos por alguém maculada na vida pregressa e profana. Rita, apesar de triste e conformada, apelou em orações aos seus santos prediletos, Agostinho, João Batista e Nícolas de Tolentino, para tirarem da mente da madre superiora o errôneo ponto de vista. Então, para muitos crentes, deu-se o milagre: certa noite, os três santos foram à casa de Rita, puseram-na nos braços e levaram-na pelos ares até o convento; e lá a deixaram, sem que fosse preciso abrir as portas do vetusto casarão das freiras. Nesse lugar, ela viveu por mais de quarenta anos, até morrer, em 22 de maio de 1453.
Essa passagem é um pouco da história da vida de Santa Rita de Cássia, repleta de lendas e de fatos sobrenaturais ou surpreendentes. O Santuário de Santa Cruz-RN, com a enorme imagem de Santa Rita – a maior estátua sacra do mundo – é algo surpreendente. Há quatro décadas e meia, morei em Santa Cruz por quase três anos, na condição de médico do Crutac, programa pioneiro da UFRN. Ainda solteiro, a maior parte desse tempo residi no próprio Hospital Ana Bezerra. Ao chegar à cidade, avistava o Monte Carmelo e o velho cruzeiro, local onde hoje se encontra a monumental imagem. Agora, a antiga paisagem ficará guardada somente na lembrança. Fico a pensar: como é que isso foi possível? Pode-se também perguntar: não se trata, pois, da Santa das causas impossíveis? Será que, no caso, outra vez houve ajuda dos três santos que levaram Rita ao convento? Ou dos padres de outrora da paróquia de Santa Cruz e que hoje podem estar no céu, entre eles o meu amigo Padre Raimundo Barbosa?
Assisti a muitas missas, casamentos e batismos, rezei e refleti na Igreja Matriz de Santa Rita, em Santa Cruz. Voltarei à cidade, para conhecer o Santuário, para visitar a velha igreja, e para ir ao hospital, outro lugar de evocação das boas emoções do passado, onde vivi e pratiquei a medicina, ainda no alvorecer da minha profissão. Muitos dos amigos, já não adianta procurá-los, estão todos dormindo longamente. Como não me lembrar de tantos nomes, por exemplo, de Miguel Farias e dona Tequinha, pais do pai da ideia do Santuário, o ex-prefeito Tomba?
Li que Santa Cruz cresceu e vai crescer com o turismo religioso. Agora, já não é somente o hotel de Zé-dó-bico e dona Maria, no centro da cidade, pois muitos outros já surgiram. De maior valor, contudo, é a expansão da fé, a partir da imagem de uma Santa de grande apelo popular, capaz de operar milagres e de acender a luz da esperança na alma dos devotos.
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