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Sair de Natal para a praia de Pirangi do Norte, no carnaval, com o intuito de relaxar, na busca de um lugar tranquilo para ler ou escrever, é, no mínimo, um contra-senso. E foi o que fiz, não por decisão própria, mas sob apelo da maioria familiar. Ao final, revogo os meus reclamos, pois o temor do barulho não se confirmou, além de que a alegria dos netos, o alvoroço dos mais novos com as pistolas de água e o mela-mela de maisena tornaram mais alegres aqueles prosaicos momentos. Na mesma casa daquela praia, meus filhos, quando pequenos, viveram iguais brincadeiras. Vejo-os agora, a cuidarem dos filhinhos, levando-os para o banho de mar, tal qual eles íam no passado, sob a minha proteção. Há cerca de 40 anos, ouve-se por aquelas bandas o tilintar do vendedor de cavaco chinês, tradição que se mantém nos dias atuais. E os meninos de ontem a pedirem para comprar, repetem-se nos de hoje, até mesmo na arenga para saber quem ganhou maior porção. O tempo passa, passamos nós, muita coisa muda, mas é bom relembrar o passado e ver que algo fica ou se replica, do mesmo jeito de tantos anos atrás.
Por que as bandinhas de outrora não mais se escutam nem se veem nas ruas da praia de Pirangi do Norte? Cadê a banda do Cajueiro na sua versão original, os papangus e os blocos dos sujos? Por falar em sujos, impõe-se uma digressão: sujeira lá não existe, merece aplausos a limpeza pública municipal. Não vi nem ouvi falar nos pequenos blocos – Índios de Pirangi e outros – encenados por gente nativa daquelas terras de beira-mar. O carnaval de rua seria bem-vindo àquela praia, local perfeito para reviver a alegria momesca nascida na alma popular. Não precisa abolir o desfile dos potentes carros de som, à noite, na avenida Márcio Marinho, pois, se atraem multidões, merecem o apoio de quem de direito. Porém, tanto o poder público quanto as empresas poderiam incentivar o tipo de carnaval do passado, para ser brincado durante o dia, menos por saudosismo e mais como forma de atender aos que gostam desse tipo de festa, bem como para resgatar as tradições e para manter viva as nossas raízes culturais.
Já fui muito mais adepto a passar alguns dias na casa da praia de Pirangi do Norte. Agora, hesito quanto à decisão de ir, mas, quando lá estou, sinto-me bem, desligo dos deveres da rotina, conforme o que ocorreu durante o recente carnaval. Além do convívio com grande parte do grupo familiar mais próximo, deu para fazer algumas boas leituras. Recebemos a visita de amigos, entre eles o simpático casal alemão, Hans e Gabrielle. São os pais da nossa "neta" alemã, Marie, intercambista do Rotary, durante um ano morando aqui em Natal.
Nesses dias, terminei a leitura – feita sem pressa – do ótimo livro "O 11º Mandamento", com 626 páginas, escrito pelo médico e Professor da Universidade de Stanford, Abraham Verghese, lançado no Brasil em 2011. Trata-se de uma incursão nos meandros da alma humana, um romance épico, uma viagem fantástica para unir medicina e literatura, em cenários da África e dos Estados Unidos. Deleite puro, ao reler alguns textos de Mário Prata, no seu livro Cem Melhores Crônicas (que, na verdade, são 129). Ao abordar fatos do cotidiano, o cronista se esmera e mostra uma escrita alegre, cheia de fino humor. Em uma das crônicas, na qual relembra coisas do passado, do tempo da brilhantina, fala da galocha – proteção de borracha para os sapatos, em dias de chuva –, dos chapéus – marcas Ramenzoni, Prada e Cury –, e da gonorreia. Sobre essa doença de transmissão sexual, Mário comenta: "Mas o que sumiu mesmo foi a gonorreia, que tanta tragédia nos trazia. Como contar para o nosso pai que se estava com aquilo? Outro dia, li no muro do cemitério da Consolação: 'Saudades da gonorreia!' E fiquei com saudades de mim mesmo".
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