Clarice e as máquinas de escrever - Centro Universitário do Rio Grande do Norte - UNI-RN
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Clarice e as máquinas de escrever

Em muitos dos textos da notável Clarice Lispector, existe algo de abstrato ou figurado. Vejamos a relação da escritora com as máquinas de escrever. Em uma crônica, Clarice assim se expressou: “Escrevendo praticamente a vida toda, a máquina de escrever ganha uma importância enorme. Irrito-me com esta auxiliar ou então agradeço-lhe fazer o papel de reproduzir bem o que sinto:  humanizo-a”. No dia 14 de setembro de 1966, Clarice Lispector sofreu o maior desafio da sua vida, quando foi vítima de um incêndio no seu próprio apartamento, situado na rua Gustavo Sampaio, Leme, Rio de Janeiro.  Clarice tomava medicação para insônia e é provável que o fogo resultou de um cigarro aceso, após o uso do remédio. Ela sofreu queimaduras graves, principalmente na mão direita. Os médicos chegaram a cogitar a amputação, mas conseguiram evitar essa terrível hipótese, porém, restaram sequelas inevitáveis.

Após essa tragédia das queimaduras, mormente com a disfunção que atingiu a mão direita da escritora, foi necessário que C. Lispector reaprendesse a escrever nas suas máquinas de escrever, de tanto apreço e emoção. Em sua crônica “Ao linotipista”, de 04 de fevereiro de 1968, a própria Clarice assim escreveu: “Desculpe em estar errando tanto na máquina. Primeiro é porque minha mão direita foi queimada. Segundo, não sei por quê”. De fato, os livros de C. L. publicados a partir de 1970, a exemplo de Água Viva (1973), A Hora da Estrela (1977) e Sopro de Vida (1978, póstumo) foram estruturados por Olga Borelli, amiga e secretária de Lispector por mais de 10 anos, a partir de notas soltas escritas à mão ou datilografadas.

No livro “Escrever de ouvido - Clarice Lispector e os romances da escuta”, a autora Marília Librandi reporta-se à crônica de C. L., de 15 de dezembro de 1973, publicada no Jornal do Brasil, e faz o seguinte comentário: “Impressiona a descrição que ela faz das máquinas de escrever que teve ao longo da vida, como se tivesse estado com elas em uma sucessão de diversos casamentos, e fossem, ela e as máquinas, juntas, as autoras dos livros que tinham publicado”.

A fim de ressaltar o crescente interesse pela obra da autora de “A Paixão Segundo G.H.”, sua grande amiga Nélida Piñon, da Academia Brasileira de Letras, declarou que, após a morte, é comum que famosos escritores fiquem no esquecimento por muito tempo, ou seja, “caiam no limbo”. Porém, com Clarice Lispector ocorreu o oposto, pois essa escritora, que faleceu em 1977, a cada dia que passa, desperta mais a atenção de incontáveis leitores ao redor do mundo, pois suas obras já foram traduzidas em vários idiomas. Escreveu romances, contos, crônicas, cartas, poesia, entrevistas, além de ter feito dezenas de traduções do francês, do inglês e do espanhol. E ainda ensaiou a pintura de alguns bons quadros. 

Daladier Pessoa Cunha Lima

Reitor do UNI-RN

Texto publicado na Tribuna do Norte, em 06/01/2022


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