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Em 1940, Clarice Lispector, já aluna do curso de Direito da Universidade do Brasil, sofre grande golpe com a morte do seu pai, logo após a realização de uma cirurgia de vesícula, com a idade de 55 anos. Já era grande amiga de Lúcio Cardoso, com quem se envolveu em sincero e quimérico amor. Em 9 de janeiro de 1941, a revista Vamos Ler, cujo diretor era o escritor Raimundo Magalhães Júnior, publicou outro conto de Clarice Lispector, sob o título de “Trecho”, em que a personagem espera, em um bar, a vinda do amado, enquanto observa os outros clientes, cada qual imerso em seus possíveis amores. No ótimo livro biográfico de C.L., a autora Teresa Montero cita um poema (Cântico do adolescente) de Augusto Frederico Schmidt (1906-1965), do qual Clarice achava que a mensagem, à época, parecia ter sido escrita para ela: “Adolescentes, passai cantando,/ A vida é dura, cantai, sofrei,/ Nada no mundo sei mais terrível,/ Que a vossa idade, que os vossos sonhos/.” A editora de Schmidt publicou o primeiro livro de Lúcio Cardoso, e os dois se tornaram amigos.
Em 1942, em meio ao romance com Lúcio Cardoso, Clarice recebe um bilhete de um colega de faculdade, Maury Gurgel Valente, propondo namoro, pois a achava muito bonita e interessante. O namoro deu certo e os dois se casaram em janeiro de 1943. Um ano depois, o casal foi morar em Belém, PA, pois esta cidade tornou-se sede de posto estratégico do Itamaraty, durante a 2ª Guerra Mundial, e Maury, então cônsul de 3ª classe, fora nomeado para servir nessa unidade da capital paraense. Em Belém, os dias eram monótonos, a não ser durante poucos eventos, entre os quais a visita à cidade da Sra. Roosevelt, conforme carta de Clarice às irmãs. Por carta, também manteve o contato com seu grande amigo Lúcio Cardoso, de quem recebia notícias da ótima repercussão literária do seu primeiro livro, “Perto do Coração Selvagem”. Em julho de 1944, quando o Brasil se preparava para entrar na 2ª Guerra Mundial, ao lado dos Aliados, Maury Gurgel Valente foi removido para o consulado de Nápoles, na Itália.
Clarice Lispector partiu do Rio de Janeiro, com o marido Maury, rumo a Nápoles, no dia 19 de julho de 1944, com pouso do avião em Natal, e se hospedaram no Hotel da Base Aérea de Parnamirim. Após cinco dias, o vice-cônsul Maury Gurgel Valente seguiu, em voo militar para Nápoles, via África, e Clarice permaneceu em Natal, durante cerca de 10 dias. Em carta a Lúcio Cardoso (“Natal, 25 de julho de 1944”), diz Clarice: “Estou lhe escrevendo de Natal, do horrivelzinho Grande Hotel daqui. Quer dizer, tudo está correndo bem, mas eu estou em Natalzinho e com saudades de minhas irmãs, de Maury, dos meus amigos do Rio e de Belém.” Em outra carta a Lúcio Cardoso, escrita de Nápoles, em setembro de 1944, Clarice volta a se reportar aos dias passados em Natal, e repete seu menosprezo pela cidade. Mas isto será assunto para outra crônica.
Daladier Pessoa Cunha Lima
Reitor do UNI-RN
Texto publicado na edição desta quinta-feira, 17/03/2022, da Tribuna do Norte
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