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“Irene no céu”
08.09.2011
Há poucos dias, conversei com uma norte-americana, médica e professora no San Antonio College, da Califórnia, sobre a crise econômica do seu país. Ela estava aqui em Natal em visita de estudos à FARN, na companhia de doze estudantes da área da saúde daquela instituição de ensino superior, em missão de intercâmbio cultural e científico. Ao transmitir-lhe a versão que ouvira na rede CNN de que a nova crise americana se devia muito a problemas políticos internos, ela concordou, mas disse preferir falar em “jogo”, no lugar de “problema” político. E culpou os partidos e grupos que se voltam contra as ações do Presidente Barak Obama, ainda que essas investidas resultem em danos ao atual Governo e ao próprio país. Parece mesmo a tese niilista do “quanto pior melhor”, com as atenções focadas para a próxima eleição presidencial. Fiquei meio surpreso, pois pensava que essa prática nefasta, tão em voga no Brasil, não era frequente entre os políticos da nação que quer ser o exemplo de democracia. Para o bem de todos, bom seria se esse mal costume deixasse de vez de existir, não somente na práxis pública do nosso país mas em toda parte. Afinal, o efeito dominó das crises está cada vez mais forte no mundo globalizado.
Agora, com o furacão Irene, mais uma vez os republicanos tentaram desgastar a imagem do Presidente Obama. De férias, o Presidente deve ter acompanhado as medidas de prevenção – aliás parecem que foram todas muito certas e eficazes –, mas a oposição o criticou de forma severa. Talvez quisesse que ele ficasse não somente de olho no furacão, mas, de preferência, no olho do próprio. Chegou-se até a aventar a hipótese catastrófica de que Obama havia deixado Washington para se proteger, porque um ato terrorista de efeito devastador estava para ocorrer a qualquer momento. De Nova York, Gerald Thomas, em artigo especial para a Folha de S. Paulo, após a passagem do Irene, escreveu: “Conspirações nos inundavam mais que as chuvas que caíam ou que as ondas que o Atlântico empurrava para a costa de Long Beach, Long Island e Nova Jersey. Irene ri. Graças a Deus. Todos agora rimos, ainda que com um pequeno nó na garganta, já que tantos rios passaram em nossas vidas nesses últimos dias, prestes a transbordar”.
Com uma neta morando na região por onde Irene passaria, fiquei com certo temor, apesar das tranquilizadoras informações que ela – minha neta – e sua “host family” do programa Rotary mandavam. Perguntei logo pelo tipo de construção da casa, se era de madeira – não era – como é comum se encontrar nos Estados Unidos, mais um paradoxo daquele país, onde são tão frequentes os tornados, furacões e ciclones. Conforme a previsão, Irene também chegou por lá, mas suas forças já eram menores, sacudiu as frondes das árvores, derrubou algumas, molhou os telhados e as pequenas ruas, e, ao sair, chamou o sol, para confortar e acalmar a todos, inclusive os que estavam distantes.
Em recente crônica nesta Tribuna, o escritor e jornalista Agnelo Alves levantou a questão do contraste da doçura do nome Irene com as mazelas, os choques e os traumas dos furacões. Procurei me informar sobre o batismo dos furacões e constatei que essas desordens naturais costumam receber nomes tanto de homens quanto de mulheres. Como podem ocorrer de forma simultânea, os nomes devem ser fáceis de decorar, para evitar confusão entre as prováveis vítimas. Mas concordo com a sensível tirada de bom humor de Agnelo, pois o nome Irene combina muito mais com algo terno e bom da natureza humana. Até o lirismo do poeta Manuel Bandeira viu Irene no céu: “Irene preta/ Irene boa/ Irene sempre de bom humor/ Imagino Irene entrando no céu: – Licença, meu branco!/ E São Pedro bonachão: – Entra, Irene. Você não precisa pedir licença”.
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