Lavem as mãos - Centro Universitário do Rio Grande do Norte - UNI-RN
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Lavem as mãos

Por que tanta ênfase ao “lavem as mãos” perante a Covid 19? É fácil de se entender, pois o vírus invade o organismo humano, principalmente, por meio das mucosas dos olhos, do nariz e da boca.  Existe uma  tendência – danosa – de se levar as mãos à face, com frequência.  Ora, esse vírus tem uma resistência fora do comum e pode permanecer vivo por dias no meio externo.  Lavar as mãos, as quais podem servir de ponte móvel entre qualquer superfície e as mucosas, é a melhor forma de se quebrar essa cadeia. Aprendi com meus queridos e ilustres professores o quanto era importante a prática de lavar as mãos no dia a dia da profissão médica.  Em 1972, quando aqui esteve o Navio-Hospital do Projeto Hope, dos Estados Unidos, vi o quanto os gringos davam valor ao lavar das mãos, em qualquer recinto do barco.  Pensaram eles ser algo de novo que traziam para nos ensinar? Se pensaram assim, mudaram de opinião, depois de conhecerem alguns médicos locais competentíssimos, a exemplo de Giselda Trigueiro, Ernani Rosado, Airton Wanderley e Ney Marques Fonseca, entre tantos outros profissionais da saúde. 

Na história da medicina, há um evento símbolo da mudança de duas épocas, o antes e o depois do olhar humano sobre um possível agente invisível e causador de muitas doenças, os micróbios.  Foi nesse tempo, por volta de 1840/50, que entra em cena o médico húngaro Ignaz Semmelweis (1818-1865), cujo nome faz logo resgatar sua obsessão, sua ordem, sua prédica: “Lavem as mãos”. Formado em 1844, meses depois, passou a trabalhar no grande Hospital de Viena, para ajudar mulheres durante o parto.  Nesse tempo, grassava a febre puerperal, doença que levava ao óbito número alto de gestantes, após darem à luz os seus rebentos. Era a época em que não se lavavam as mãos nos hospitais, os quais eram imundos e fétidos, os aventais de médicos e de enfermeiras estavam sempre sujos de pus e de sangue.  A febre puerperal, já descrita por Hipócrates desde o ano 400 a.C., era um pavor, e, por não se conhecer ainda os micróbios, suas supostas causas geravam discussões estéreis e sem fim.

Semmelweis prestava serviços médicos às mulheres que iam ao Hospital em trabalho de parto, bem como fazia autópsias no corpo das que morriam de febre puerperal, cerca de 800 casos a cada ano, internadas em duas enfermarias. Observador atento, com atenção para os detalhes, ele fez um confronto entre causa e efeito, até comprovar que as mulheres da enfermaria atendidas por médicos e estudantes, os quais faziam autópsias e iam direto para a prestação da assistência ao parto, com os mesmos aventais e as mãos sujas, morriam muito mais da febre do que as gestantes da outra ala, sob os cuidados de parteiras, isentas da contaminação nas necropsias.  Foi aí que o médico húngaro Ignaz Semmelweis, antes de Pasteur e de Lister, ordenou: os médicos e os acadêmicos teriam de lavar as mãos com vigor, usando uma solução de cloreto de cálcio.  Com isso, a letalidade da febre puerperal, no Hospital de Viena, despencou de 20% para 1%.

Esse herói da medicina sofreu injustiças e, por pressão de certos doutores vienenses, foi desligado da Universidade de Viena.  Voltou para Budapest, onde se tornou um vibrante arauto da higiene. Consta que ficou louco e saía pelas ruas, aos gritos de “lavem as mãos, lavem as mãos”. 

Daladier Pessoa Cunha Lima

Reitor do UNI-RN

Publicado na edição desta quinta-feira, 02/04/2002,  do jornal Tribuna do Norte


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