Medicina e literatura (2) - Centro Universitário do Rio Grande do Norte - UNI-RN
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Medicina e literatura (2)

Ao final da crônica anterior, ficou uma pergunta: “É possível estabelecer uma relação precisa, uma associação causal entre medicina e literatura?” Não restam dúvidas de que existe uma afinidade entre medicina e literatura. O uso da palavra escrita é para o escritor uma condição sine qua non, bem como é para o médico um meio útil à boa prática da profissão, além de servir como válvula de escape de suas angústias diante dos dramas humanos decorrentes das doenças. O médico e escritor Dráuzio Varela, na introdução do seu livro “Por um fio”, de 2004, profere: “Há muitos anos penso que, se conseguisse construir um caleidoscópio com as histórias dos doentes que conheci na prática da cancerologia, com as reações de seus familiares e amigos próximos, talvez pudesse transformá-lo num livro”. E Dráuzio Varela, a partir desse caleidoscópio, escreveu a própria obra “Por um fio”, além de outras nascidas das fortes emoções da sua vivência médica. Sem ser um atributo próprio da profissão médica, é óbvio, existem múltiplas formas de vínculos entre a medicina e a literatura. É fácil encontrar médicos que também são escritores, dos quais alguns podem se alinhar entre grandes nomes tanto da literatura nacional quanto da mundial.

Um outro médico e escritor, Moacyr Scliar, cita a teoria da Psicanálise – criação do médico Sigmund Freud – como um exemplo da associação entre a medicina e a literatura, e afirma: “Psicanálise sem palavras é impossível, como é impossível literatura sem palavras”. Em verdade, Freud buscou a compreensão do inconsciente, e, para isso, louvou-se no estudo de grandes obras literárias, com ênfase em escritos de Goethe e Shakespeare. No livro “Freud com os escritores” – 2013 –, os autores dizem que o romantismo alemão preparou o terreno para as pesquisas de Freud sobre o sonho, porém, não o afastou de procurar a explicação nos conflitos da pessoa dividida entre o eu consciente e as suas forças inconscientes. Freud também foi um leitor voraz de outros famosos autores, sendo amigo de alguns deles, entre os quais se destaca Stefan Zweig.

Até mesmo uma prosaica evidência comprova a ligação entre a medicina e a literatura, no tocante à leitura e à escrita servirem como terapia. Não usada como prescrição médica, os que costumam ler e escrever podem constatar o quanto essa prática é uma benesse a favor do bem-estar pessoal, ou seja, da boa condição de saúde. No Brasil, com o nome de biblioterapia, existem bons estudos nessa área, que usa a literatura como forma de psicoterapia, na busca de melhorar a saúde dos seres humanos. Em outros países, onde esse tema está mais avançado, encontram-se até setores especializados, entre os quais está a National Association for Poetry Therapy. No site dessa Associação, acham-se resumos de algumas pesquisas que mostram o quanto a biblioterapia pode ser útil até mesmo no apoio ao tratamento dos doentes com câncer.

Por outro lado, as doenças, os hospitais, a figura do médico, a prática da profissão, a vida e a morte, tudo isso compõe o leitmotiv de grandes obras que também vinculam a medicina à literatura e às artes. Nesse contexto, estão muitas obras-primas, cujas leituras fixam-se na lembrança, a exemplo de: A Montanha Mágica, de Thomas Mann; A Peste, de Camus; A Morte de Ivan Ilich, de Tolstói; O Alienista, de Machado de Assis; além de Nêmesis – mais recente –, de Philip Roth.  

Daladier Pessoa Cunha Lima

Reitor do UNI-RN


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