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O amigo beija-flor
15.03.2011
Tenho um amigo beija-flor, um pássaro mesmo, com suas asas velozes e seu corpinho fino e esguio. Moro em uma casa com muito verde, bom lugar para as pequenas aves de Deus. O verde se compõe de plantas de jardim, de amplo gramado e de árvores que dão frutos. Entre os diversos tipos de pássaros que frequentam esse espaço, está o meu amigo beija-flor, ou os meus amigos beija-flores. Quando me demoro no exterior da casa, é muito comum ele aparecer com sua agitação para beijar uma flor ou somente para dar o ar da sua graça. Sei que outras pessoas, vez por outra, também se deleitam com sua presença, mas comigo, nas andanças pelo jardim, é quase certeza encontrá-lo por instantes. Talvez pressinta que sou seu amigo, quem sabe, pois gosto de vê-lo e espero alguns minutos para que apareça. Vejo-o com afeição, carinho e especial apreço. E acho que ele já percebeu isso; não se faz de rogado para chegar perto e me brindar com seus graciosos shows aéreos. Até no meu escritório/biblioteca, lugar onde mais demoro quando estou em casa, ele já adentrou por três vezes. Ah! Confesso que o agrado com um tipo de refeição líquida, própria para esses bichinhos. Certo dia, os olhos dos meus netos brilharam, quando o avô, feliz da vida, mostrou-lhes um ninho de beija-flor. Vocês já viram um ninho desses? Tão pequenos e tão bem feitos, obras-primas do mundo natural.
Como já disse, moro em um lugar abençoado, onde vejo e sinto a natureza e sua magia. O verde acalma, purifica e anima. Agora mesmo, quando escrevo este texto, estou a ouvir bonito trinado e a ver o balançar das folhas de uma palmeira. Tenho duas palmeiras lindas, dessas que não crescem muito. São vistosas e parecem até que sorriem para quem delas se aproxima. Certa vez, vendi uma casa que tinha no quintal um grande cajueiro. Enviei para o jornal um anúncio mais ou menos assim: “Vende-se um cajueiro que produz deliciosos frutos vermelhos e que oferece uma sombra maravilhosa. Sua fronde é enorme e, quando está florido, é de uma beleza sem igual. Acompanha uma casa com três quartos, duas salas, etc, etc”. Choveu de gente para comprar, e, em uma semana, vendi a casa, digo, vendi o cajueiro, tendo o comprador recebido de agrado o imóvel contíguo.
Chego a pensar que se eu fosse agora vender minha casa, faria um aviso semelhante. Além das duas palmeiras, poderia oferecer à venda também uma jaqueira que é uma verdadeira rainha, um pau-brasil que é o rei, duas mangueiras – uma espada e uma rosa –, pitangueiras, pés de acerola, três coqueiros que dão coco com água deliciosa. No entanto, Deus me livre de fazer isso, até porque também adoro a própria casa e o seu interior. Mas é o conjunto que me prende, seduz e encanta.
Após uma noite de sono pouco tranquilo, por causa de música vinda da vizinhança, acordei cedo naquele domingo e fui ver o verde e os primeiros raios do sol. Nessa hora, os pássaros costumam saudar a manhã, voar, saltitar e cantar com alegria. Destaque para os bem-te-vis, com a festa que sempre fazem. Lá estavam, as lavadeiras, as rolinhas, os pardais, os papa-capins e outros que não sei identificar. Sabiás e galos-de-campina são raros por aqui. De repente, chegou o amigo beija-flor, não beijou nada, parou no ar à minha frente com a vibração das suas asinhas nervosas, fez uma volta rápida e sumiu em voo direto para longe. Isso me fez esquecer a ressaca da noite maldormida e inspirou-me para escrever esta crônica. Fiquei a matutar sobre aquele pequeno-grande amigo, que traz no nome o verbo beijar, expressão de amor, de afeto e de bem-querer, além da palavra flor, símbolo maior da harmonia, da paz e da beleza. Cheguei mesmo a pensar: como haver dúvida de que Deus existe?
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