O iPad e o rei Salomão - Centro Universitário do Rio Grande do Norte - UNI-RN
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O iPad e o rei Salomão
11.04.2011

Tenho em casa uma victrola RCA-Victor, fabricada nos Estados Unidos em 1904, que ainda tem suas funções quase perfeitas. O móvel se parece com uma bonita cômoda de cerejeira; funciona com corda ativada por manivela, para girar disco de 78 rotações, no qual uma agulha tira os sons das ranhuras do vinil. Quando foi lançada no mercado, cerca de um século atrás, deve ter sido uma revolução, um avanço inimaginável da tecnologia, um assombro. Gerações passadas usaram-na e se deleitaram com a música – volume único – que saía daquele móvel, como se fosse uma mágica. Hoje, o iPod, pouco maior do que uma caixa de fósforo, dispõe de arquivo musical incrível. Resolvi escrever este texto quando, por acaso, encontrei o iPod, com milhares de músicas, sobre a tampa da victrola, um contraste capaz de fazer pensar nas mudanças e evoluções geradas pelas maravilhas da mente humana. Não tenho contrato com a Apple, mas admito a grande admiração e a adesão também ao iPad. Um pequeno equipamento, fácil de usar, leve, no qual você obtém sons e imagens quase sem limites. Informações, diversão, lazer, trabalho, leitura, tudo às suas mãos e ao seu dispor, sem fios, discos, chips ou outro acessório qualquer. Apenas um cabo para realimentar na tomada elétrica e um paninho para limpar a tela. Há de se reconhecer o gênio criador de Steve Jobs. Costumo usar o iPad para saber as notícias ao redor do mundo, para acessar a internet e para esporádicas leituras de jornais e de livros. Devo confessar a preferência por jornais, revistas e livros de papel, mas acho que as duas formas se complementam. Nos dias atuais, não dá para prescindir dos avanços tecnológicos à nossa disposição, não obstante a convicção de que o homem muitas vezes desvirtua as benesses provindas das graças de Deus. Agora mesmo, tenho novamente a sensação do contraste, ao fazer uma leitura no iPad de trechos da Bíblia. Ali estão juntos a ciência da eletrônica e os escritos da fé, o tablet e os textos bíblicos, para mostrar, simbolicamente, a compatibilidade íntima entre os dois, apesar de parecer algo contrastante. Para expressar essa ideia de união possível entre os mistérios da fé e a razão, ou as inquietudes da ciência, nada melhor do que as primeiras palavras da encíclica Fides et Ratio – Fé e Razão – lançada pelo papa João Paulo II, para celebrar, em 1998, o 20º aniversário do seu pontificado: “ A fé e a razão são como duas asas nas quais o espírito humano se eleva para a contemplação da verdade”. João Paulo, autêntico “scholar”, cuja beatificação deverá ocorrer a primeiro de maio próximo, embasou sua formação cultural nos cânones de Santo Tomás de Aquino, e em muitos outros profundos estudos da filosofia e da teologia. Por isso, ele disse: “Quando a fé não pensa, não é nada”. O Papa teve a coragem de reabilitar Galileu do erro histórico da Igreja, além de aceitar a teoria da evolução de Darwin, sem lhe aplicar, contudo, uma leitura de estreito materialismo. Assim, ele disse: “Não tenham medo da verdade”. Atrevo-me a falar do conforto da leitura da Bíblia por meio eletrônico. Com rapidez, localiza-se o livro que se quer, o capítulo e os versículos do Novo ou do Antigo Testamento. Facilmente, passa-se de um setor para outro, ou confrontam-se passagens dos Evangelhos, por exemplo. Sei que alguém radical poderá criticar essa forma de acesso eletrônico aos textos sagrados, mas isso é uma questão pontual. Á minha frente, a telinha luminosa do tablet mostra o livro que fala das vaidades, o Eclesiastes, atribuído ao rei Salomão, cerca de nove séculos antes de Cristo. Leio o versículo dezoito do capítulo primeiro: “Porque na muita sabedoria há muito enfado; e o que aumenta em conhecimento, aumenta em dor”. Face os desvarios do uso da energia nuclear, estaria a atual dor do povo japonês no âmbito das predições do Eclesiastes?

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