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O mundo pós-americano
05.06.2008
Minha geração conheceu os temores da Guerra Fria: de um lado os Estados Unidos, do outro, a União Soviética, em constantes ondas de tensão que sobressaltavam o planeta. Com a queda do Muro de Berlim, em 1989, inicia-se a fase do mundo unipolar, com o poder americano a se sobrepor por todo o globo. A brusca e terrível ação terrorista de 11 de setembro de 2001 deixou os Estados Unidos perplexos. A resposta ao antiamericanismo crescente veio em forma de guerras, com as invasões do Afeganistão e do Iraque. O jornal Folha de S. Paulo, no caderno Ilustrada – 15/05/2008 –, publicou foto de soldado americano em trincheira no Afeganistão e o seguinte comentário. “A metáfora da exaustão do soldado ilustra de forma perspicaz a posição atual da falta de rumos do governo americano na condução política dos conflitos após o 11 de setembro. Mais de seis anos depois, os Estados Unidos, assim como o soldado na trincheira, não sabem mais porque estão ali, tampouco o que fazer para sair dessa situação”. A foto, feita pelo britânico Tim Hetherington, venceu o prêmio deste ano do World Press Photo e mostra o jovem combatente desolado, solitário, capaz de passar mensagem que vai além do desespero.
“A ascensão do resto”, apesar do título, é longa, boa e recente matéria publicada na revista Newsweek, a qual faz precisa análise da situação atual dos Estados Unidos. O autor, Fareed Zakaria, relata pesquisa feita entre os americanos, a qual revelou que 81% dos pesquisados vêem o país em uma rota errada. No período de 25 anos da mesma pesquisa, essa foi a mais negativa de todas. Mas há motivo para tal pessimismo: pânico financeiro, recessão clara, guerras sem fim, ameaças de terrorismo. A ansiedade americana se espalha desde algo mais profundo, pois há um sentimento de que forças destrutivas contra o país estão em curso. Na verdade, o que está em curso é o crescimento de outras regiões do planeta. São reflexos desse cenário: o mais alto prédio do mundo está em Taiwan; a maior companhia pública de comércio está em Beijing; a Índia terá a maior refinaria; Hollywood está perdendo seu esplendor para Bollywood (Índia). Até os cassinos de Macao já ameaçam a grandiosidade e o luxo de Las Vegas. Das dez pessoas mais ricas do mundo, somente duas são americanas, muito diferente de dez anos atrás.
Nas duas últimas décadas, países fora das nações mais industrializadas do ocidente têm crescido em níveis até então impensáveis. Economistas famosos identificam 25 companhias que serão as próximas grandes multinacionais, inclusive quatro do Brasil, além de outras da Korea do Sul, México, Índia, Taiwan, China, Argentina, Chile, Malásia e África do Sul. O autor diz, então, que “Isto é o crescimento do resto – do resto do mundo”, fruto da globalização. No plano político-militar, ainda haverá domínio americano, mas esse domínio não se repete no tocante a outras dimensões – industrial, financeira, educacional, social e cultural.
A matéria da Newsweek é um resumo do livro “The Pós-American World”, de Fareed Zakaria. Jornalista e editor, nascido na Índia, pós-graduado em Yale e em Harvard, o autor vive em New York e é famoso cientista político. Sua conclusão é de que o mundo está passando do antiamericanismo para o pós-americanismo, e, mais ainda, que os Estados Unidos não devem perder a fé nas idéias que tanto pregaram, de um mundo aberto para o mercado, para as novas tecnologias e para as liberdades políticas. O futuro deve registrar o sucesso dos Estados Unidos, na virada do século 21, em sua grande missão de incentivar a globalização; e não que esse mesmo país esqueceu, ele próprio, de se globalizar ao longo do caminho.
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