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Retorno a uma crônica afim, e com o mesmo título, que publiquei em 2010. As festas juninas remetem-nos para velhos tempos, acalentam lembranças da infância, fazem recordar fatos e encantos do passado. Evocam-se santos alegres, festeiros, ligados a crendices e superstições, com forte apelo popular e que vão além da convicção religiosa. Quem fica indiferente a uma rua embandeirada, ao colorido das roupas das quadrilhas, ao ritmo do baião e do forró, à visão ou ao cheiro das canjicas, das pamonhas, dos bolos e do milho assado?
Menino do interior, tive a sorte de passar várias festas juninas nas fazendas Riacho e Favela, terras do meu avô materno, seu Chiquinho, em São José de Campestre. Noites alegres, inesquecíveis, rojões, busca-pés, traques, e estrelinhas; muita comida de milho, sanfona e pandeiro, tudo e todos ao redor de enorme fogueira. A família reunida e meu avô no comando, pois era o mais animado do grupo. Com requinte, sabia puxar quadrilha, quando não faltavam palavras de ordem com timbre francês: balancê, anavantur, anarriê, travessê, e por aí seguia. Lembro que um jovem vaqueiro da fazenda Riacho convidou-me para ser seu compadre de fogueira. Sobre dois tições em brasas, feito uma cruz, o aperto de mãos selava o compromisso, ao se repetir quatro vezes, mudando de lugar: “São João disse, São Pedro confirmou, que nós fôssemos compadres, que Jesus Cristo mandou.” O vaqueiro Chico Borges, que depois se transformou em dono de parte da fazenda, levou a sério aquele contrato e, ao longo do tempo, fomos compadres de verdade, nas saudações e na amizade. Chico Borges morreu ainda moço, por doença cruel e rápida. Seu compadre de fogueira, mesmo médico, tentou ajudar, mas nada pôde fazer.
A devoção popular atribui a Santo Antonio a graça de operar milagres, para atender suspiros e preces de moças à procura de um noivo. Tenho uma amiga, já com muitos natais, que ainda não perdeu a esperança, pois o seu Santo querido “tarda mas não falta”. Muitas dessas crenças e crendices vieram com os portugueses para o Brasil, conforme estudos de Câmara Cascudo e de outros folcloristas. Alguns anos atrás, visitei a Igreja dos Mártires, em Lisboa, localizada na rua Garrett, no Chiado. É uma linda igreja, reconstruída depois do terremoto de 1755. A fachada fica quase rente à rua e vis-a-vis com o famoso bar A Brasileira, que tem a figura em bronze de Fernando Pessoa, sentado a uma mesa da calçada, a escutar – quem sabe? – os sinos da sua aldeia. Nas laterais da nave principal da Igreja, existem altares de santos bem conhecidos, todos adornados com flores e com velas luzentes deixadas pelos devotos. Porém o altar mais florido e com real profusão de velas era o de Santo Antonio. Assim, lá como aqui, ainda são muitas mulheres à espera do dia de dizer “aceito”, embora estejam em voga o ata e o desata dos novos casais. Parece até que o Antonio lá de cima só atua na fase da escolha, mas não fornece termo de garantia.
São João é o mais festeiro dos três. Não é à toa que a fogueira vincula-se ao seu dia, 24 de junho, quando Isabel fez queimar a lenha para avisar à prima Maria o nascimento de João Batista. E São Pedro, pescador da Galileia e protetor das viúvas? Não precisa dizer nada, basta relembrar que ele tem nas mãos as chaves do céu.
Daladier Pessoa Cunha Lima
Reitor do UNI-RN
Texto publicado na Tribuna do Norte, em 23/06/2022
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