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Volto às cartas antigas, guardiães do tempo, coleções grafadas de sonhos e ideais, de júbilos e tristezas, de aplausos e desdéns, de anelos e de frustrações, enfim, das mais diversas ideias e emoções da alma humana. Instado por uma amiga, disse-lhe que nunca me dediquei à redação de cartas, no entanto, não podia dizer o mesmo sobre meu pai, Diógenes da Cunha Lima (1906-1972), homem com pouca instrução formal, mas que gostava de ler e de escrever. No livro biográfico “Sob Um Olhar Azul”, autoria de Diogenes da Cunha Lima, filho, encontram-se antigas cartas escritas por Diógenes, pai, em especial para sua noivinha, Eunice, bem assim para filhos, netos e amigos.
O livro citado é a biografia de Diógenes da Cunha Lima, pai. Na recente segunda leitura que fiz, percebi mais o quanto o autor foi feliz em manter vivo o perfil de um homem bom, simples, inteligente, cheio de ternura e de amor: “Sua vida foi rica, lírica, e, no melhor sentido, humana”. Seu semblante chamava a atenção por dois traços marcantes: o sorriso quase constante e os olhos bem azuis, com um olhar de intenso brilho. Diogenes, o autor, diz que ficou na dúvida quanto ao melhor título, Um Sorriso Solidário, ou, Sob Um Olhar Azul, e conclui: “O olhar venceu o sorriso”. No caso, digo eu: o poeta falou mais alto.
Diógenes da Cunha Lima chegou a Nova Cruz no começo da década de 1930, vindo da Paraíba, para se fixar no comércio de tecidos. Lá, conheceu a bonita jovem Eunice, filha de Francisco Targino Pessoa e Olindina Ramalho Pessoa, casal dos mais prestigiados na região. Eunice, ainda aluna da Escola Doméstica de Natal, e Diógenes logo passaram a namorar, noivaram e se casaram, em 1933. Desse bonito casal, nasceram seis filhos: Aryam (falecido), Gilma, Diogenes, Daladier, Marcelo e Olindina. Durante a fase de noivado, a família de Eunice alternou a morada entre Nova Cruz, Natal e São José de Campestre, o que obrigou o noivo a enviar à noivinha cartas para expressar seu afeto, seu bem-querer e seu grande amor.
Eis o resumo de carta do noivo, Diógenes, para a noiva, ”Dileta Eunice”, de 25 de maio de 1932, transcrita no livro Sob Um Olhar Azul: “Estou de posse da tua missiva de ontem, que me trouxe uma confortadora consolação. Vejo bem que tu ainda sabes amar ao teu noivo; que não arrefece e nem arrefecerá nunca jamais uma só parcela da tua amizade e dos teus afetos por mim. (...) Longe, bem longe, onde me levasse o destino, eu não esqueceria a ti, como não esqueci. (...) És tu, Nicinha, a mensageira das minhas venturas. (...) Saudades do teu noivo, Diógenes”.
Além de várias outras cartas repletas de ternura, há um diário com registros semelhantes, escritos pelo noivo. Há ainda missiva de Diógenes a Francisco Targino, futuro sogro, pedindo Eunice em casamento: “Tomo a devida liberdade de pedir em casamento a sua dileta filhinha Eunice. Sei que você bem me conhece. Entretanto, quero adiantar-lhe que, apesar dos esforços, sou desprovido de bens materiais. (...) Seu amigo atento Diógenes da Cunha Lima”. Podemos, então, dizer: “o tempora! o mores!” Ó tempos! Ó costumes! Bem assim, rápido uma conclusão vem à mente: muitas cartas antigas, através do tempo, guardam em suas linhas – entre outros fatos e vivências – lindas histórias de amor.
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